Não poderiamos deixar de trazer o registro da reportagem do Diário do Nordeste deste domingo (30), sem falar dos que eles retratam - As histórias e a programação do sesquicentenário do verdadeiro Palco de Icó:--> O Grande Palco da Vida - Nilda Peixoto, vovó rock´n´roll
Antes de chegar aos 20 anos, Nilda Peixoto, 76 anos, subiu ao palco do Teatro da Ribeira dos Icós, integrando a trupe improvisada de Walfrido Monteiro, advogado que mais tarde fez carreira na política, chegando a ser prefeito da cidade e deputado estadual.
"A peça era ´Essa mulher é minha´, sobre um homem que se apaixonava por uma mulher, mas os pais dela não queriam o namoro. Eu fazia uma vó valente dela. Era só sobre essas besteiras do povo antigo, que não aceitava nada", conta Nilda, crítica ácida dos costumes. "Eu só queria ser novinha hoje, pra matar o desejo de fazer o que queria naquela época. Antigamente, você não podia fazer nada. Se desse um beijo no namorado, no meio da rua, você ficava falada na cidade".
Na lembrança de Nilda Peixoto, o grande responsável pela agitação teatral da cidade era "Zé" Walfrido. Era na casa dele, então um pouco mais velho que Nilda, que o grupo de amigos ensaiava.
"O ensaio era de noite, mas só tinha luz até 22 horas", diz. "Muitos dos que participaram dessas peças já morreram. Outros estão vivos, como a Mônica, que é mãe do (deputado) Domingos Filhos. Mas naquela época não tinha muita coisa não, era tudo muito pobre. A gente fazia mesmo porque gostava. Usava roupa do povo antigo como figurino", esmiúça.
"Já te contei de quando o rock ´n ´roll chegou aqui no Icó?", surpreende. Quando o ritmo sacolejante chegou, pelos idos de 1955, Nilda topou dançar numa apresentação no foyer, ao som de uma vitrola. "Só que era escondido da família. Quando botei o pé na sala, o primeiro que vi foi um irmão meu. A cagada já ´tava feita e eu dancei do mesmo jeito".
Dançando conforme a dança (ou ´Ai que vontade de fazer teatro´)
Jovens na casa dos 20, 30 e poucos anos, os integrantes do grupo SincerAtos, um dos raros em atividade em Icó, são a representação precisa de uma nova relação da cidade com o Teatro da Ribeira. Na infância e adolescência de todos eles, o teatro era pouco mais que um equipamento cultural combalido e um prédio antigo e mal conservado. Mais habitado por fantasmas do que por artistas.
Ainda assim, Wellington Silva, ator, diretor e homem de frente do SincerAtos, sentia algo diferente em relação àquele prédio de outros tempos. "Desde criança, vejo o teatro não como uma casa de espetáculos, mas como um espaço sagrado", conta, fazendo a sobrenaturalidade tomar outro rumo. "Aqui, é um espaço sagrado. Não só para os atores, mas para todos os artistas. É um espaço a ser respeitado". Wellington discorda da atual utilização do teatro, que abre exceções para eventos diversos, sem conexões com as artes cênicas.
A falta de um teatro vivo condicionou as primeiras experiências do grupo na cidade. "De início, comecei a trabalhar com teatro de rua, pois o Teatro da Ribeira não estava adequado para receber trabalhos. Só depois, quando ele passou a se reestruturar, com algumas reformas, começamos a fazer espetáculos aqui dentro", explica.
Com amigos autodidatas na arte de atuar, escrever e dirigir, formou o grupo há um ano e meio. Com apoio de comerciantes e da Prefeitura, montaram sua primeira peça, a comédia "Aconteceu comigo".
Uma noite, para nunca mais
Mal o dia começa, Eduardo Monteiro já está a postos na Farmácia Nossa Senhora de Fátima, no centro comercial de Icó. Aos 82, recebe amigos, de gerações tão antigas ou mais novas que a sua. Caso de Chiquinho Peixoto, agrônomo aposentado e memorialista da cidade, que costuma passar ali pelo menos uma vez por semana.
Eduardo é um homem cheio de histórias para contar. Assistiu, por exemplo, aos altos e baixos do Teatro da Ribeira. "Quando eu era rapazinho, os espetáculos que se apresentavam eram mais esses daqui mesmo. Era difícil aparecerem peças de fora, de outras cidades. Outra coisa que tinha muito por lá era reuniões políticas. Aí sim, vinha deputado, governador, senador, muita gente de fora".
"Eu mesmo fiz uma papel uma vez. Fiz um médico num espetáculo. ´Deus lhe pague´, acho que foi esse o que fiz. "Quem me chamou foi Walfrido. Eu trabalhava com ele na época. A vergonha de aparecer era muita. Mas a gente tomava um ´melzinho´, uma cachacinha, e pegava coragem. Fiz só uma e não quis mais saber. Depois era só assistir. Sem beber, eu não teria entrado em cena", confessa, aos risos.
Mistérios por trás das cortinas
Separados por uma rua, o teatro e o antigo sobrado do Barão do Crato estão unidos por uma das mais conhecidas lendas de Icó
"Como toda cidade antiga, Icó é cheia de histórias", conta Getúlio Oliveira, secretário de Educação da cidade e responsável pela pasta de Cultura à época da última reforma do Teatro da Ribeira dos Icós.
O Sobrado Canela Preta, equipamento cultural da Prefeitura onde funciona uma escola de música, é um dos prédios sobre os quais as lendas falam. Ali muita gente jura que já viu e ouviu coisas estranhas.
A lenda mais famosa a ter o Teatro da Ribeira dos Icós como cenário é a da existência de um túnel que o ligaria ao antigo sobrado do Barão do Crato (distante cerca de 20 metros). A passagem servira como salvaguarda do Barão, em caso de sua residência ser invadida por inimigos.
O historiador Altino Afonso ressalta outra versão, até cômica, segundo a qual o túnel seria utilizado normalmente pelo barão, para chegar ao teatro e assistir a peças. Sua função seria a de não permitir que ele esbarrasse com os icoenses, aos quais teria aversão.
"Diziam até que, neste túnel, existiriam obras de arte, ouro e riquezas", conta Getúlio Oliveira, referindo-se às versões mais fantasiosas sobre o túnel. "Na época da reforma, conversei com o superintendente do Iphan sobre a história do túnel, que gente na cidade garantia existir.
Ele disse que, se quiséssemos, uma escavação poderia ser feita. Preferi não fazer isso. Eu tinha consciência que não havia túnel ali, só que se eu fosse atrás dele aconteceria o pior: eu mataria a lenda", justifica.
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A PROGRAMAÇÃO - Na iminência da Festa - Em andamento
Diferente do TJA e do São João, o Teatro da Ribeira dos Icós tem por data de aniversário apenas uma interrogação. "Já pedi aos historiadores da cidade para descobrirem o dia e o mês exatos, mas não conseguimos", conta Jequélia Alcântara, secretária da Cultura de Icó.
Sem uma data de maior relevo, coube aos gestores do teatro uma comemoração que se estendesse por todo o ano. "Tanto que nossa programação já começou. Tivemos alguns espetáculo neste primeiro semestre, ouve o lançamento do livro ´Bem vindo ao reino do louro e da peixada´ (que trata dos marcos históricos da cidade, entre os quais, o Teatro da Ribeira) e há duas semanas inauguramos o cineclube, onde exibimos produções do cinema nacional e promovemos, na sequências, debates sobre elas", enumera a secretária.
Jequélia promete programações quinzenais com apresentações de linguagens artísticas diversas. "Quanto a programação conjunta com o Estado, estamos vendo a possibilidade de trazer, entre outras, um espetáculo de fora do País", antecipa a Jequélia Alcântara.
A secretária comemora, ainda, a conclusão de uma obra que não faz parte do teatro, mas que diz respeito a ele: um auditório municipal. Entre as críticas recorrentes ao teatro de Icó, está seu sistema precário de som e iluminação e, sobretudo, a utilização do teatro para fins não culturais.
"Veja como é complicado: a cidade é muito quente. Então, quando vem programações de fora ficamos numa saia justa. Tem coisa que não dá para dizer não, como programações gratuitas que alguns universidades nos oferecem. Às vezes, passamos para a Câmara dos Vereadores. Mas quando é grande, tem que ser no teatro mesmo. É o lugar que tem", explica a secretária.
Ela assegura, no entanto, que a prioridade são os espetáculos de música, teatro e dança. "Apenas se sobrar alguma data em nossa agenda é que recebemos outras coisas. Desde que começaram as comemorações dos 150 anos, só abri exceções para as secretarias do município", conta.
No entanto, o problema deve ser resolvido ainda em junho. "Falta apenas ajustar a rampa de acesso para cadeirantes e a empresa do ar condicionado fazer os testes necessários. A boa notícia é que, assim que o auditório estiver ok, temos autorização da Prefeitura para fazer a manutenção", revela a secretária, sem que esconder que, com o uso mais moderado da casa, a preservação da mesma será mais eficiente.
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