
No mesmo contexto de espiritualidade colonial, que não necessitava de padres para conduzir a religião, surgiram as demais devoções icoenses públicas: Nossa Senhora da Expectação, Nossa Senhora da Conceição e Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, afora as mais diversas devoções particulares, cultuadas nos santuários domésticos e mesmo nas igrejas, cuja imaginária em madeira ainda se pode encontrar.
Em meados do Século XVII, foi editada pelo Rei de Portugal D. José I, uma Carta Régia proibindo a criação do gado no litoral. As fronteiras da pecuária, então, dirigiram-se ao sertão, imensos campos a serem desbravados, como o seriam passo-a-passo, lutando contra o tempo e contra o índio, cujas nações foram massacradas e extintas pela presença branca.
De Pernambuco (sertão de fora) e Bahia (sertão de dentro) o gado se deslocava acompanhando o curso dos rios, sobretudo o Rio São Francisco, apelidado de Rio dos Currais, pois naquela época as fazendas eram denominadas de "currais".
Com a redução do índios nas missões (jesuíticas, carmelitas, franciscanas e outras ordens religiosas) estava aberta a porta por onde passariam os vaqueiros - mamelucos del São Paulo e de outras etnias - que efetivamente ocupariam o sertão.
De Pernambuco (sertão de fora) e Bahia (sertão de dentro) o gado se deslocava acompanhando o curso dos rios, sobretudo o Rio São Francisco, apelidado de Rio dos Currais, pois naquela época as fazendas eram denominadas de "currais".
Com a redução do índios nas missões (jesuíticas, carmelitas, franciscanas e outras ordens religiosas) estava aberta a porta por onde passariam os vaqueiros - mamelucos del São Paulo e de outras etnias - que efetivamente ocupariam o sertão.
É nesse contexto de colonização que se iniciaria, aos poucos, a devoção ao Senhor do Bonfim. A imagem do Cristo padecente, ferido, ensanguentado, sofrido, encontraria identificação com o povo miúdo, com os escravos e com os colonos, sempre tão expostos a um fim trágico. Daí apegar-se ao Senhor do Bonfim - Da Boa Morte - era (e é) algo necessário para o desamparado e sofrido sertanejo.
Com o passar dos séculos a devoção eminentemente laica, passa aos poucos sair das mãos do povo e dirigir-se às mãos do clero, numa apropriação e legitimação própria do sistema de "cristandade" de forma que a participação laica passa a ser periférica. Esse fenômeno dar-se particularmente ao iniciar-se o século XX e o processo de Romanização da Igreja Católica.
Outro fenômeno - sem tentar fazer uma análise mais aprofundada não específica a este tipo de espaço midiático - é a tentativa de apropriação política da devoção do Senhor do Bonfim, de forma que os governantes "de plantão" sempre tentam legitimar ideologicamente sua hegemonia pela participação nos festejos.
Nem sempre "devotos" nem "católicos", vem ao longo dos anos revestidos de "pia devoção", seja na participação dos novenários, na organização dos eventos, considerados culturais, em íntima conexão com com o poder religioso - carente dos recursos materiais para o sucesso da festa, desde a montagem do palco-altar, à iluminação pública, serviços de som, ornamentação das vias públicas (arcos, tapetes, limpeza urbana, disciplinamento dos bares e barracas, etc).
Assim, tem-se consagrado a ereção de um arco luminoso de frente ao paço municipal, por onde obrigatoriamente a procissão desfila no dia 1º de janeiro.
Lá, no balcão histórico do sobradão que abriga a prefeitura municipal, engalfilham-se os membros dos clãs do poder, numa demonstração ideológica, ao povão que segue a imagem em seu andor, de quem é que manda na cidade, quase unindo sua imagem à imagem do santo, em suma, tentativa de legitimação de poder político-religiosa.
Enquanto os mais exaltados em alta e exaltada voz, brandam: "Viva o Senhor do Bonfim!!!", quase a dizer: Viva o nosso prefeito! Viva a nossa elite governante.
Nem sempre "devotos" nem "católicos", vem ao longo dos anos revestidos de "pia devoção", seja na participação dos novenários, na organização dos eventos, considerados culturais, em íntima conexão com com o poder religioso - carente dos recursos materiais para o sucesso da festa, desde a montagem do palco-altar, à iluminação pública, serviços de som, ornamentação das vias públicas (arcos, tapetes, limpeza urbana, disciplinamento dos bares e barracas, etc).

Assim, tem-se consagrado a ereção de um arco luminoso de frente ao paço municipal, por onde obrigatoriamente a procissão desfila no dia 1º de janeiro.
Lá, no balcão histórico do sobradão que abriga a prefeitura municipal, engalfilham-se os membros dos clãs do poder, numa demonstração ideológica, ao povão que segue a imagem em seu andor, de quem é que manda na cidade, quase unindo sua imagem à imagem do santo, em suma, tentativa de legitimação de poder político-religiosa.
Enquanto os mais exaltados em alta e exaltada voz, brandam: "Viva o Senhor do Bonfim!!!", quase a dizer: Viva o nosso prefeito! Viva a nossa elite governante.
Fato marcante e divisor de águas nas práticas religiosas icoenses, ocorreu em meados dos anos oitenta, após a investida pastoral de um grupo de padres jesuítas que então eram os párocos de Icó, que perceberam com muita nitidez a manipulação política do Senhor do Bonfim. Houve um sério conflito entre Igreja e Políticos.
De uma certa maneira Igreja e Estado (em nível municipal) De um lado a intransigência dos religiosos e religiosas que tentavam impor à força os conceitos da teologia da libertação e o afastamento dos leigos que tradicionalmente cuidavam da festa, delegando poderes a novos grupos de pastorais renovadas, há época formados por jovens de "esquerda" e que viriam a formar o PT.
Para esse grupo tudo que era velho e tradicional não prestava. Do outro lado os políticos do PDS/ARENA/PLF e católicos tradicionalistas que não abriam mão das liberdades até então possíveis. O fato resultou no encerramento da festa do Senhor do Bonfim pelo Bispo Diocesano após a missa solene das 10 horas, proibindo a procissão, e que mesmo assim foi à rua, com "bombas e tudo" às cinco da tarde pelas mãos do povo e dos políticos.
E houve muita intriga, muito disse-me-disse, que anos passaram-se com as arestas abertas, até chegar-se a um consenso mais ou menos apaziguador, mas mesmo assim já houveram tapas e empurrões em tempos mais recentes... não obstante o estilo pastoral ser, em essência, o de "Cristandade" englobando toda a cidade e bairros periféricos, onde todo o espaço da urbe e sub-urbe icoense torna-se católica, mesmo que na "marra", com suas sonoras procissões das cinco da manhã e autos falantes nos postes da cidade, obrigando a católicos ou não a ouvirem todas as solenidades religiosas e músicas sacras o dia inteiro.
_________________
* Texto escrito por Washington Luiz Peixoto Vieira - Blog Icó Nacional
0 comentários :
Postar um comentário